PRISCILA CRUZ
Priscila Cruz é fundadora e presidente-executiva do movimento Todos Pela Educação.
Graduada em Administração (FGV) e Direito (USP), mestre em Administração Pública (Harvard
Kennedy School), foi coordenadora do ano do voluntariado no Brasil e do Instituto Faça Parte,
que ajudou a fundar.
Sabe aquela história de que só se é criança uma vez? Geralmente, falamos isso
pensando na alegria, disposição e leveza típicas da infância, que não se repetem
em mais nenhuma fase da vida de maneira tão genuína. Mas essa máxima também
é verdadeira no que diz respeito ao desenvolvimento infantil, especialmente o que
ocorre entre os 0 e 6 anos de idade.
Segundo pesquisas de diferentes áreas
(https://www.todospelaeducacao.org.br/conteudos-especiais/46096/perguntas-
-respostas-o-que-voce-precisa-saber-sobre-primeira-infancia/), nos primeiros 6
anos de vida, o cérebro infantil é como um foguete em disparada, capaz de romper
a atmosfera, faminto por descobrir a imensidão da aprendizagem.
Diante dessa e de outras especificidades, o cidadão pequeno tem uma série de
direitos assegurados em leis --como o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA)
(http://www.crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/publi/camara/estatuto_crianca_ad
e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (
(http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/l9394.htm)LDB)
(http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/l9394.htm)--, direitos estes que vão
muito além do cuidado e da segurança.
O Estado e todos nós temos o dever de assegurar que nossas crianças possam se
desenvolver plenamente, isso engloba não apenas os deveres tradicionais de
assistência e proteção, mas também sinaliza um compromisso com o reino do porvir: dar a elas a chance de serem o melhor que puderem, por meio dos estímulos
adequados à Primeira Infância. É nesse contexto que a Educação surge como um
direito essencial, capaz de combinar cuidado, proteção e desenvolvimento integral.
Para garantir que não haja desvios na vocação dessa etapa, é preciso avaliá-la.
Pensando nisso, o Ministério da Educação (MEC) anunciou recentemente que a
partir do ano que vem, e a cada dois anos, os profissionais da Educação Infantil
terão de avaliar as condições ofertadas aos alunos da Creche e da Pré-escola
(https://educacao.uol.com.br/noticias/2018/06/28/mec-tera-novo-sistema-deexames-e-passara-a-avaliar-creche-em-2019.htm).
Na verdade, a medida chega atrasada, tendo sido estabelecida em 2010, nas
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI)
(http://ndi.ufsc.br/files/2012/02/Diretrizes-Curriculares-para-a-E-I.pdf) e ter sido
prevista no Plano Nacional de Educação (PNE) para 2016.
A proposta é positiva? Sim, mas é preciso lembrar que estamos falando de um
público muito especial e, portanto, é preciso ficar claro o que pode e o que não pode
ser essa avaliação. Não pode: ser de seleção, aprovação/reprovação de alunos.
Pode: ser um instrumento de acompanhamento do desenvolvimento individual de
cada aluno e monitoramento da Educação Infantil.
O primeiro ponto está atrelado ao fato de que essa avaliação não pode ser um
exame. Desde a vida intrauterina até os 6 anos de idade, a criança é um aspirador
de conhecimento, mas não aprende linearmente como uma criança mais velha.
Digamos que o cérebro infantil na Primeira Infância é um foguete que segue uma
rota variável, parando em todo planeta que vê pela frente, aproveitando as
oportunidades que aparecem, sem ter o compromisso de atingir uma linha de
chegada. Estamos falando de aprendizagem em outra lógica. Diante disso, não faz
sentido dizer que João está aprovado e Maria reprovada no primeiro ano da Creche.
Já com relação ao segundo ponto, sobre o que essa avaliação deve ser, o Sistema
de Avaliação da Educação Básica (Saeb) da Educação Infantil deve estar
concentrado em averiguar se está tudo certo para o foguete infantil alçar voo.
Trata-se de criar um espaço em que a criança possa criar, brincar, inventar,
experimentar, sentir, relacionar-se e, no meio de tudo isso, aprender. Esses são
conceitos alinhados a uma nova concepção de Creche
(https://www.todospelaeducacao.org.br/conteudos-especiais/46085/crechemuito-alem-da-vaga/)
e Pré-escola, espaços que, felizmente, deixaram há décadas
de ser apenas dedicados a cuidado e assistência infantil.
Só se é criança uma vez, mesmo, e não podemos deixar de assegurar que, nesse
curto período, os pequenos tenham a melhor infância possível em todos os
sentidos. Os estímulos ideais devem permear toda a escola: do mobiliário ao
tratamento dos profissionais com as crianças, da massa de modelar à hora do
lanche. A avaliação da qualidade desses serviços ajudará os gestores das redes de
ensino e os professores a identificarem os aspectos que precisam de melhorias.
Se feita com qualidade, a avaliação do Ensino Infantil será uma oportunidade de,
finalmente, darmos um salto rumo a uma etapa de ensino que olha para a criança
em sua complexidade e não apenas como alguém que precisa de cuidado.
Essa mudança de paradigma será capaz de criar não apenas oportunidades para
as crianças, especialmente as provenientes de situação de maior vulnerabilidade,
como para o País, uma vez que a Educação Infantil é a etapa que mais dá retorno
(http://www.enciclopedia-crianca.com/cerebro/sintese) à vida individual e
coletiva de uma Nação, garantindo redução da desigualdade e aumento da renda
média, por exemplo.