segunda-feira, 1 de maio de 2017

As máscaras que colocamos em nossas crianças


Leticia Sorg

LETICIA SORG


Um outro olhar sobre as notícias



Como os estereótipos podem criar meninos solitários e infelizes - além de meninas sorridentes e arrumadinhas
Ela tem que sorrir. Ser disciplinada. Assentir. E, de preferência, ser bonita e arrumada.
Ele tem que parecer sério. Desafiar. E, de preferência, esconder qualquer traço de medo.
Não, não sou eu quem está dizendo isso às meninas e aos meninos. É a sociedade, são os pais, os professores, a mídia. Nem sempre paramos para pensar no impacto dessas mensagens no comportamento das crianças, mas uma iniciativa nos Estados Unidos tem se esforçado para mudar esse cenário. É o Representation Project, que fez dois documentários para questionar os estereótipos impostos a meninas e meninos.
O trabalho começou com Miss Representation, sobre o qual falei em 2011, quando escrevia para a revista Época. O filme gerou muito debate ao questionar a supervalorização da beleza na vida das mulheres. Mostrava incontáveis capas de revista, propagandas e filmes, todos estrelados por mulheres altas, magras, geralmente de cabelos compridos. Questionava a pressão para se enquadrar nesse padrão de beleza. E propunha buscar novos modelos de sucesso para meninas e mulheres. Modelos não baseados na aparência física.
O movimento pegou e, mesmo no tapete vermelho, focar na estética não é mais bem visto. Recentemente, a atriz Blake Lively, convidada para falar sobre o combate à pornografia infantil, se irritou com um repórter que insistiu em perguntar sobre sua roupa. Sério que, diante de tantas questões, essa era a melhor? As mulheres de Hollywood têm se unido para barrar a pergunta única sobre beleza na campanha #AskHerMore, da qual já falei aqui.
Esse é só um exemplo. O documentário também discute como a moda trata as mulheres, como as mulheres acabam sendo julgadas por sua aparência mesmo na política – coisa mais rara para os homens – e como isso se reflete na falta de ambição das meninas. Elas querem ser bonitas – e aceitas. E, às vezes, só isso. Preocupante.
Mais recentemente, o mesmo projeto voltou a discutir os estereótipos de gênero, dessa vez se concentrando nos efeitos sobre os meninos. A chocante conclusão pode ser vista no documentário The Mask You Live In, disponível no Netflix – agradeço aqui a uma leitora pela sugestão!
O filme conta que criamos os meninos para que sejam fortes e independentes. O que parece bom. Mas também para que engulam o choro e não “ajam como meninas”. E aí começam os problemas: os meninos tentam resolver tudo sozinhos, às vezes com resultados desastrosos. Colocam a máscara da indiferença, da violência, da rebeldia para esconder o turbilhão de dúvidas e medos. E também começam a ver características ditas “femininas” como negativas. E aí temos uma origem do machismo: se as mulheres têm características negativas, por que respeitá-las?
O resultado desse tipo de expectativa social é que grande parte dos meninos sofre, sozinho, os dramas e traumas da adolescência. Sem ajuda, têm mais problemas na escola e são maioria entre as vítimas de suicídio. Não à toa este post vem pouco depois de eu escrever sobre a série 13 Reasons Why.
Os meninos, assim como as meninas, sentem o efeito dos estereótipos de gênero logo cedo. E também continuam sofrendo com eles ao longo da vida. Em coisas tão simples como não se sentir à vontade para dizer que faz ioga ou pedir um suco de laranja em vez de um chope no bar com os amigos. É sobre isso que Gustavo Tanaka falou em um post que foi compartilhado centenas de vezes no Facebook.

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