sábado, 29 de julho de 2017

'Se um velho experiente se digitalizar, ele engole você'

SEXTA, 28/07/2017, 15:08Jornal da CBN - Entrevista

'Se um velho experiente se digitalizar, ele engole você'

Tonico Novaes, diretor-geral da Campus Party Brasil, alertou as novas gerações que o conhecimento das novidades não garante um espaço no mercado de trabalho.


A educação e a formação do profissional do futuro

QUINTA, 27/07/2017, 20:35

A educação e a formação do profissional do futuro

A jornalista Bianca Santos conversou com Antônio Gois, jornalista especializado em educação e colunista da CBN, Ronaldo Mota, reitor da Estácio de Sá e ex-secretário nacional de ensino superior do MEC, e Fabiano Gallindo, especialista em inovação e assessor do conselho empresarial de tecnologia da Firjan. O talk show foi gravado na segunda-feira (24) na Livraria da Travessa do Shopping Leblon, na Zona Sul do Rio:

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Como fugir do fanatismo

claudia costin
Cláudia Costin
É professora da FGV e professora-visitante de Harvard. Foi diretora de Educação do Bird, secretária de Educação do Rio e ministra da Administração.


Em livro publicado em 2006, Amartya Sen, economista indiano detentor de um Prêmio Nobel, defendia que temos múltiplas identidades e que a violência ocorre quando permitimos que uma delas se torne hegemônica e sufoque as outras. 

Somos seres plurais, em diálogo constante com o mundo que nos cerca, e vamos, num processo de homeostase, incorporando novas vivências e ideias, o que nos leva eventualmente a adquirir novas identidades.

A análise de Sen parece convergir com a de Amós Oz, escritor israelense que esteve recentemente no Brasil para lançar seu livro "Mais de uma Luz". No livro, o autor se pergunta como surge o fanatismo que, num certo sentido, envolve alienar-se de si mesmo e viver a vida de outrem ou um sistema de vida que elimine a difícil tarefa da vida adulta que é fazer escolhas e constituir identidades.

O fanático bloqueia o processo de contato com o meio em que vivemos e opta por seguir as prescrições de um líder, de uma celebridade ou de um mestre, sem reflexões ou elaborações próprias. Ele é incapaz de empatia genuína, pois, não se percebendo como pessoa independente, não consegue tampouco entender as motivações e sentimentos do outro.

Parece haver também a impossibilidade do humor, particularmente o ato de rir de si mesmo. Como há uma certa sacralização das condutas, inspiradas por um líder genial das massas ou um mestre inquestionável, o humor dirigido a si próprio torna-se quase uma heresia.

Mas não vamos confundir as coisas. O fanático, segundo Oz, pode ser um altruísta: ele genuinamente pode acreditar que, ao massacrar pessoas ou perseguir quem pensa diferente, está lutando pelo bem do outro. Trata-se de uma estranha forma do que Jonathan Sacks chama de altruísmo do mal: para o seu bem nesta ou em outra vida, vou lhe agredir.

Quando a escola não ensina a pensar, não se propõe a promover a autonomia do aluno, infelizmente se torna parte dessa engrenagem de produção de fanáticos. E, na adolescência, dadas as inseguranças naturais da etapa, é mais fácil atuar nessa direção, afinal é mais confortável se o professor dá respostas fechadas para todas as minhas perguntas, e os fanáticos, diz Oz (e, num certo sentido, alguns adolescentes também), odeiam respostas abertas.

E qual o antídoto, no ambiente escolar, para o fanatismo? Certamente a formação para a autonomia e para o pensamento independente fazem parte da solução, mas dois elementos devem integrar essa forma de instrução, a curiosidade e a imaginação, meios poderosos de compreensão do mundo, de si mesmo e do outro.

Não por acaso, integram também o receituário de Amós Oz para evitar o fanatismo.

Como o Regime de Colaboração pode ajudar o PNE a sair do papel


"A parceria entre os entes federados é capaz de criar mecanismos que estimulem melhorias individuas e viabilizem a o avanço de indicadores da Educação", afirma o Movimento Colabora Educação

Todos Pela Educação
Plano Nacional de Educação (PNE) aborda as principais questões estruturais da Educação Pública no Brasil de forma objetiva, definindo metas, estratégias, avaliações e prazos com o objetivo melhorar a Educação do País. Uma estratégia prevista pelo PNE que pode nos ajudar a cumpri-lo, especialmente em tempos de crise, é o Regime de Colaboração.
A colaboração na gestão pública não é nenhuma novidade. A Constituição Federal prevê que “a União, os Estados e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino”. Ela está nas raízes do PNE que, desde a sua criação seguindo os princípios da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 (LDB/96), considerou os diferentes papéis dos entes federados – ou seja, Municípios, Estados e a União – para garantir acesso à Educação de qualidade em todo o território nacional.
O Regime de Colaboração é uma estratégia, não um fim, e pode ser aplicado às diferentes esferas da gestão pública, não se restringindo apenas à Educação. Existem dois tipos de regime: o vertical e o horizontal. Na colaboração vertical a cooperação acontece entre entes federados de diferentes esferas como, por exemplo, quando um Estado cria uma política de indução para estimular e apoiar os Municípios na melhoria da gestão da Educação. Na colaboração horizontal, entes federados de mesmo nível se unem para solucionar problemas comuns. Os consórcios públicos e os Arranjos de Desenvolvimento da Educação são exemplos dos quais municípios vizinhos se juntam para solucionar dificuldades comuns ou potencializar os resultados. Produzir diagnósticos, elaborar metas e planos de ações territoriais, ofertar conjuntamente formação continuada aos professores, compartilhar boas práticas e estabelecer parcerias são algumas das possibilidades que abrem. Ademais, quando a organização se dá via consórcios, viabiliza-se a realização de aquisições compartilhadas, seja de produtos ou de serviços, cujo benefício se dá pelo ganho de escala.
Um exemplo emblemático de colaboração vertical e que apresentou impacto direto em resultados é o Estado do Ceará onde, em 2007, foi criado o Pacto pela Alfabetização na Idade Certa (Paic). O projeto trouxe melhorias aos indicadores da qualidade da aprendizagem no Ensino Fundamental, tendo sido o único Estado em que todos os municípios atingiram a meta do  Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) 2015 para os Anos Iniciais. O resultado não se limita à melhoria do indicador, que passou de 3,8 em 2007  para 5,9 em 2015 (contra uma meta de 4,5 em 2015), mas também reforça a equidade do ensino, garantindo que o avanço atinja todos os municípios do estado e não apenas uma região privilegiada. Outro exemplo importante de colaboração vertical da parte do Ministério da Educação (MEC) foi a criação do Plano de Ações Articuladas (PAR), em 2007, uma ferramenta colaborativa de planejamento para secretarias de Educação municipais e estaduais. A colaboração nesse caso acontece diretamente entre as secretarias, que reportam os problemas de suas redes, e o ministério, que fornece assessoria técnica e recursos para que mudanças sejam implementadas. O PAR preserva a autonomia de estados e municípios e teve como consequência a melhoria da integração entre estes e o ministério.
Analisando o documento do PNE, a expressão “Regime de Colaboração” e termos relacionados aparecem em 14 das 20 metas e em 32 das 254 estratégias que englobam áreas como Educação Infantil, formação de professores e financiamento da Educação.
"A colaboração entre entes permite aproveitar sinergias, potencializar as boas práticas, minimizar as desigualdades e alcançar resultados a longo do processo. – Movimento Colabora Educação"

Por exemplo, as estratégias da Meta 7 do PNE  posicionam a pactuação como ferramenta para definir as diretrizes pedagógicas, a criação de indicadores de avaliação, de índices de qualidade de serviços e de formação de professores das redes. Além disso, ao definir objetivos para o IDEB  nacional, a meta 7 implica uma ação coordenada entre redes, de forma a melhorar o indicador geral do País com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem, principalmente considerando que muitos alunos passam por transições entre redes municipais e estaduais ao longo de sua vida escolar.
Na Meta 20, que trata do Financiamento da Educação, o tema Regime de Colaboração se torna ainda mais relevante. Nela as estratégias defendem claramente a função da União como articuladora dos recursos complementares aos Estados e Municípios, além de defender a criação de novas normas de colaboração entre os entes federados e de um Sistema Nacional de Educação.
Além disso, a Meta 2 , sobre o Ensino Fundamental, apesar de não ter em seu texto o termo Regime de Colaboração, trata do tema em suas duas primeiras estratégias, pregando a colaboração, articulação e pactuação entre entes federados e o MEC para elaboração de proposta de direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento para todos os alunos do Ensino Fundamental, assim como para a implantação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC ) no Ensino Fundamental.
Todos esses temas são essenciais para assegurar que a Educação nacional suba de patamar e para garantir que o impacto do PNE seja continuado. A estratégia do regime de colaboração deve ser fortalecida, já que é capaz de promover a solução de problemas conjuntamente, criando mecanismos que estimulam melhorias individuas e viabilizam a melhoria de indicadores da Educação.
Uma boa aplicação do Regime de Colaboração depende ainda do engajamento dos diversos atores envolvidos. É preciso desenvolver a cultura da atuação em colaboração que, para além das questões legais de constituição e funcionamento, passa também pela consolidação de uma agenda territorial comum, pelo fortalecimento da confiança mútua, pela escolha de bons indicadores, pelo compartilhamento de responsabilidades e pelo constante alinhamento da comunicação,
Os Estados, a União e o MEC podem ter um papel de fomento à colaboração, criando instrumentos e mecanismos de indução e de suporte seja para aqueles territórios que já estão organizados em regime de colaboração e querem aperfeiçoar suas práticas ou para aqueles que estão na fase inicial de implantação. Além do mais, todos os entes federados podem ter papéis ativos em regime de colaboração horizontal. Nos consórcios, por exemplo, são traçadas finalidades específicas para cada membro, que podem incluir elaboração de currículos, formação de professores, compras para alimentação escolar, além de outros assuntos comuns aos municípios integrantes, mas não relacionados à Educação.
A implementação do PNE é, por si só, um grande desafio para todas as instâncias. O Regime de Colaboração, para além de premissa do próprio Plano, apresenta-se como estratégia fundamental para garantir que várias de suas metas sejam atingidas e os resultados conquistados, sustentáveis. Trata-se de poderosa ferramenta para todos os gestores públicos. Pode não ser o caminho mais fácil, mas nos abre a possibilidade de sermos mais efetivos. Permite aproveitar sinergias, potencializar as boas práticas, minimizar as desigualdades e alcançar resultados melhores ao longo do processo.
 *Movimento Colabora Educação, organização parceira do movimento Todos Pela Educação no Observatório do PNE.
Essa análise integra o balanço de três do Plano Nacional de Educação divulgado em 22/06 pelos parceiros do Observatório do PNE. Saiba mais.

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Tecnologia e emprego no comércio

O ajuste ao novo mercado de trabalho dependerá em grande parte da existência de uma educação de boa qualidade

José Pastore, O Estado de S.Paulo
27 Julho 2017 | 05h00
Nos últimos anos, comércio e serviços têm sido os setores que mais geraram empregos. No Brasil, eles respondem por 75% da mão de obra ocupada. São também os setores que possuem a mais variada composição de qualificações, indo desde os profissionais altamente especializados, como no caso dos bancos, seguradoras, pesquisa, saúde e educação, até os menos qualificados, como é o caso do pessoal auxiliar em lojas, restaurantes e hotéis, atividades de asseio e conservação, segurança e outros. 
A entrada maciça do comércio eletrônico está revolucionando o modo de os consumidores comprarem, provocando o fechamento das lojas tradicionais. Só no primeiro semestre de 2017 foram eliminados mais de 100 mil postos de trabalho no comércio nos Estados Unidos. Grandes redes de lojas estão fechando por falta de demanda, na medida em que os consumidores vão preferindo a internet. Sessenta e cinco por cento dos livros são comprados dessa forma; o mesmo ocorre com 45% do material de escritório, 40% dos brinquedos e 30% dos eletrônicos. Nos supermercados, cresce o número de lojas sem profissionais no caixa – os consumidores entram, fazem as compras e registram o gasto no leitor ótico com seu telefone celular.
O encolhimento do emprego nesse setor é uma realidade mundial. Para cada emprego que se abre no comércio eletrônico, há três que são eliminados nos estabelecimentos tradicionais. O desemprego tecnológico atinge parcelas estratégicas da força de trabalho do comércio – mulheres, idosos e pessoas com menor qualificação. Nos Estados Unidos, projeta-se uma perda de mais de 6 milhões de empregos no setor ao longo dos próximos cinco anos. O fenômeno avança em praticamente todos os países, pondo em risco os atuais 200 milhões de empregos das lojas de varejo.
O mesmo ocorre no setor de restaurantes e hotelaria. É cada vez maior o número de restaurantes que usam novas tecnologias para servir ou entregar refeições. A rede McDonald’s acaba de instalar 14 mil quiosques de autoatendimento nos Estados Unidos, poupando os atendentes de balcão. E tem planos para crescer. A Amazon iniciou um serviço de entrega de refeições, substituindo os garçons. No campo da hotelaria, cresce o número de hotéis onde a entrada e a saída dos hóspedes são feitas em máquinas eletrônicas e a limpeza dos quartos, realizada por robôs. 
O Brasil não está isento dos impactos dessas mudanças. Em relatório recém-publicado, a Consultoria McKinsey estima que cerca de 50% dos atuais postos de trabalho no Brasil poderão ser automatizados em um período de 10 a 15 anos. Esse é, sem dúvida, o maior desafio para os formuladores de políticas públicas, que têm de atenuar os efeitos deletérios do avanço tecnológico. 
Ocorre que faltam métodos seguros para fazer previsões nesse campo. É por isso que alguns pesquisadores estão propondo a construção de índices de automação e, sobretudo, de uso de inteligência artificial (Erik Brymjolfsson e Tom Mitchel, Tracking how technology is transforming work, Revista Nature, abril de 2017). São ferramentas de grande utilidade para se redesenhar os currículos das escolas para atender a demandas emergentes. 
Embora esse ferramental seja ainda embrionário, uma coisa é certa: o ajuste ao novo mercado de trabalho dependerá em grande parte da existência de uma educação de boa qualidade e que permita às pessoas aproveitarem as novas oportunidades profissionais. Essa educação terá de ser continuada ao longo de toda a vida profissional e, quem sabe, na aposentadoria. 
*PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, PRESIDENTE DO CONSELHO DE EMPREGO E RELAÇÕES DO TRABALHO 
DA FECOMERCIO-SP, É MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS.

Uma fábrica para chamar de sua

Depois de eliminar o intermediário em diversas atividades do setor de serviços, chegou a vez da tecnologia mudar o processo industrial

Guy Perelmuter*, O Estado de S.Paulo
27 Julho 2017 | 05h03
De acordo com dados compilados pela Organização das Nações Unidas, entre 1970 e 2010 a participação do setor manufatureiro no produto interno bruto global caiu de aproximadamente 26% para 16%. Conforme já discutimos, isso ocorreu em função da automação e do aumento de produtividade, a exemplo do que aconteceu anteriormente no setor agrícola (que também experimentou uma redução significativa em termos de quantidade de empregados e participação no PIB). A quantidade de empregos no setor de serviços aumentou significativamente, ocupando no Brasil dois em cada três empregados. Entretanto, com os avanços obtidos em técnicas de inteligência artificial aliadas ao maior poder de processamento e armazenamento dos computadores, uma série de atividades antes exclusivamente ao alcance de seres humanos já estão sendo executadas por máquinas. Isso pode ser parte do motivo pelo qual o movimento maker vem ganhando força no mundo todo, e é considerado uma importante tendência no mundo dos negócios.
Em janeiro de 2010, o escritor e empreendedor Chris Anderson publicou um artigo na revista Wired: "In the Next Industrial Revolution, Atoms Are the New Bits" - ou "Na Próxima Revolução Industrial, os Átomos são os Novos Bits". O argumento de Anderson é que, se durante a popularização da Internet tornou-se muito fácil compartilhar um programa de computador (bits) e desenvolvê-lo em conjunto com centenas ou milhares de colaboradores, agora o mesmo se aplica ao desenvolvimento de produtos "reais" (átomos). O impacto deste fenômeno promete ser significativo. Até pouco tempo atrás, manufaturar algo era intrinsicamente caro: linhas de montagem, equipamentos pesados, fornecedores, estoques, distribuição, logística, escalabilidade. Tudo tinha que ser planejado cuidadosamente, e a viabilidade econômica dependia da aceitação do produto por um grande número de consumidores.
O acesso a espaços maker, equipados com scanners 3D, impressoras 3D, sensores, microcontroladores e ferramentas de construção e modelagem permite que um amplo número de pessoas volte a trabalhar com um novo tipo de manufatura. O tempo para prototipar, desenvolver, implementar e testar uma nova idéia é medido em horas ou dias - é possível experimentar, aperfeiçoar e colaborar praticamente em tempo real, de vários lugares do mundo. A exemplo de tantas outras indústrias, agora a tecnologia retira o intermediário do processo produtivo de bens físicos - é a desintermediação da manufatura.
Universidades, centros de pesquisa e corporações já estão empenhados em integrar a cultura maker às suas respectivas culturas. A NASA, agência espacial norte-americana, possui um programa chamado NASA Solve no qual problemas reais que precisam ser resolvidos são compartilhados com o público - e as soluções vencedoras são remuneradas. Em 2009, por exemplo, um dos vencedores desenvolveu em seu maker space caseiro protótipos para novas luvas a serem utilizadas por astronautas, recebendo duzentos mil dólares pelo trabalho.
Empresas como GE, Intel, Microsoft e Google também estão criando espaços destinados para criação utilizando técnicas associadas não a modelos tradicionais mas sim ao estilo maker de abordagem de problemas. Conhecer a cultura maker é tipicamente o primeiro passo para ser capaz de incorporá-la ao processo produtivo, seguido do desenvolvimento ou o uso de espaços para permitir que atividades criativas e voltadas à resolução de problemas práticos possam ser experimentadas.
Mas a manufatura está longe de ser a única atividade que está em plena transformação devido ao uso de novas tecnologias e equipamentos pelos makers. Com as impressoras 3D, a expressão "fazer um sanduíche" passa a ter um significado completamente novo. É sobre o impacto dessa nova tecnologia na indústria de alimentos que iremos falar na semana que vem. Até lá.
*Fundador da GRIDS Capital, é Engenheiro de Computação e Mestre em Inteligência Artificial

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Estamos avançando na construção de uma gestão educacional democrática?

"O fortalecimento das diferentes instâncias de participação, sejam fóruns, agremiações ou conselhos, é algo que não pode ser negligenciado e requer ações concretas", afirma Beatriz Cortese, do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária

Todos Pela Educação

A participação social é um direito humano e sua efetivação no cotidiano escolar é fundamental para a formação cidadã, conforme previsto na Constituição e na  Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). O Plano Nacional de Educação (PNE), em seu artigo 9º e em sua Meta 19, reafirma a necessidade de garantir a regulamentação e o estímulo à construção de mecanismos e instâncias de gestão democrática. Avançar na implementação e no monitoramento destes dispositivos, porém, têm sido imensos desafios.
O monitoramento é dificultado pela falta de indicadores específicos e de estudos qualitativos. Temos poucas informações sobre a existência de órgãos colegiados, leis ou programas que aprimorem a gestão democrática, sendo insuficientes para analisar a qualidade da participação social na Educação do País. Feito esta importante ressalva, os indicadores existentes permitem levantar algumas hipóteses se estamos ou não próximos de cumprir a meta 19 do PNE.
As respostas de diretores de escolas ao questionário contextual da Prova Brasil trazem algumas informações importantes sobre o tema, embora não mantenha uma série histórica consistente. Em relação à seleção dos gestores escolares, os dados das últimas duas edições da prova apontam que pouco mudou. Infelizmente, em 2015, 45,5% dos diretores respondentes informaram que assumiram o cargo por indicação. A eleição foi apontada por 21,9%. Já o processo seletivo combinado com eleição foi o método respondido por apenas 5,7%.
Também é possível observar diferenças significativas entre as redes de ensino. Enquanto nas redes estaduais a indicação é uma realidade em pouco menos de 25% das escolas, nas redes municipais esse número se mantém preocupante: quase 60%. Em relação à associação entre processo seletivo e eleição, houve queda nas duas redes. Contudo, nas municipais essa opção não chega a 10%, e nas estaduais fica em torno de 20%. A situação preocupa, pois essa forma de seleção de gestores é a que melhor atende às exigências do PNE de associar critérios técnicos de mérito e desempenho à consulta pública a comunidades escolares.
A Prova Brasil pergunta também sobre o número de vezes que o Conselho Escolar se reúne anualmente e quais segmentos da comunidade escolar (professores, funcionários, alunos e pais) participam do colegiado. As respostas indicam a existência dessa instância em mais de 90% das escolas públicas brasileiras. O fato de a maioria delas ter representantes de todos os segmentos e se reunir três vezes ou mais durante o ano mostra que a comunidade sabe a importância dessa participação. Porém, não é possível afirmar, a partir das evidências disponíveis, que este seja efetivamente um espaço de debate, e não uma mera esfera burocrática.
Outra determinação do PNE é o incentivo para que estados, Distrito Federal e municípios constituam Fóruns Permanentes de Educação, estratégia 19,3, com o intuito de coordenar as conferências em todos os âmbitos, bem como efetuar o acompanhamento da execução do PNE e dos planos de Educação. Contudo, um levantamento realizado pela Secretaria Executiva do Fórum Nacional de Educação (FNE), no final de 2015 e início de 2016, indica que apenas um terço dos municípios constituíram seus próprios fóruns.
É preciso lembrar que a existência dos fóruns por si só não é suficiente para garantir o cumprimento dessa estratégia. Há uma fragilidade institucional desses espaços, como podemos observar recentemente, quando o Governo Federal alterou a composição do FNE e retirou atribuições que eram de responsabilidade deste colegiado, como a supervisão e orientação da Conferência Nacional de Educação (Conae). A medida foi amplamente questionada pela comunidade educacional e alvo de recomendação do Ministério Público Federal, que criticou a mudança. É preciso lembrar que o FNE foi instituído por meio de portaria, e não por força de lei. Isto torna frágil a sua manutenção, dado que sua composição e atribuição podem ser alteradas facilmente pelo Executivo. O mesmo ocorre em muitos estados e municípios. Esse cenário indica, mais uma vez, que há a necessidade de se ampliar os esforços para que o PNE seja efetivamente implementado e resulte em uma maior ampliação dos espaços democráticos de discussão sobre a qualidade da Educação.
A superação destas lacunas passa necessariamente pela construção do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Sinaeb), também previsto no plano. Em 2016, a portaria revogada do Sinaeb trazia entre suas diretrizes a construção de indicadores relacionados à gestão democrática, que abordava dimensões como financiamento, planejamento e gestão e participação. Esta discussão precisa, portanto, ser retomada e ampliada, especialmente entre a comunidade educacional.
O fortalecimento das diferentes instâncias de participação, sejam fóruns, agremiações ou conselhos, é algo que não pode ser negligenciado. Isto requer ações concretas do poder público, como formação, financiamento, ampla disponibilidade e abertura para um debate republicano com diferentes segmentos da sociedade.
*Cenpec, organização parceira do movimento Todos Pela Educação no Observatório do PNE.
Confira também:
Entrevista com Cleuza Repulho, especialista em Educação,  sobre os processos de seleção de diretores escolares

segunda-feira, 24 de julho de 2017

Fake news é um conceito que mal se popularizou e já perde o sentido

alessandra orofino
Alessandra Orofino
É economista, cofundadora da Rede Meu Rio e diretora da organização Nossas. Curadora do blog #AgoraÉQueSãoElas.


Kim Kataguiri, ex-colunista desta mesma Folha, está em campanha: publicou vídeo em que defende o fim do regime semiaberto usando dados comprovadamente falsos. Uma jornalista da Agência Pública resolveu checar as informações dadas por Kim –entre outras coisas, ele afirma que a reincidência atingiria mais de 70% dos presos no Brasil. A jornalista enviou então um e-mail ao MBL, o grupo de adolescentes e jovens raivosos do qual Kim faz parte, pedindo a fonte dos dados. Em resposta, recebeu uma imagem de um pênis ereto com as palavras "Check This!" (Cheque Isso!).

O caso virou pauta do Greg News, o programa da HBO que tenho o prazer de dirigir, e da coluna de Ancelmo Gois. Kim publicou então novo vídeo, dando o link para um estudo do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que supostamente corroboraria seus dados. Só que o estudo diz exatamente o contrário do afirmado pelo MBL: sobre a tal taxa de reincidência de 70% entre os detentos, o CNJ afirma que não houve "pesquisa que pudesse avaliar a veracidade deste número". 

Enquanto isso, o Ministério Público do Rio divulgou a agenda de um evento sobre segurança pública que conta com Kim entre seus palestrantes.

Nessa mesma semana, em São Paulo, a rádio CBN publicou uma denúncia: pessoas em situação de rua estariam sendo acordadas com jatos de água em meio ao frio intenso da cidade. Pouco depois, João Doria veio a público afirmar que se tratava de um "descuido": a empresa que faz a limpeza das calçadas do centro tinha acidentalmente molhado os cobertores de alguns dos moradores de rua que dormiam por ali.

O tal descuido acontece no seio de uma administração que tem pecado pela falta de políticas públicas adequadas para a população de rua: o decreto de zeladoria publicado pelo prefeito originalmente previa que as ações de limpeza urbana pudessem ocorrer de madrugada, dando margem para que pessoas fossem acordadas de forma sistematicamente desumana e degradante. O decreto também abria brecha para que objetos pessoais, inclusive cobertores, fossem retirados pela Guarda Civil. Ambos os pontos só foram revistos depois de mobilização popular.

Aí o Jornalivre, ligado ao MBL de Kim, publicou artigo no qual estampa o rosto da jornalista da CBN responsável pela denúncia, chamando-a de "militante de extrema esquerda". A razão: dois posts publicados por ela em 2013, um criticando a gestão Haddad pela repressão violenta aos protestos de junho, e outro comemorando o fato de a presidência ter se encontrado com manifestantes. O Jornalivre também chama a reportagem da CBN sobre os jatos de água de "fake news".

Fake news é daqueles conceitos que mal se popularizaram e já estão sendo esvaziados de sentido. Em um de seus vídeos mais recentes, o MBL insinua que a Globo News é um veículo de fake news– usando, na edição, a voz de Donald Trump, que usa o termo para se referir à CNN. A própria Folha é constantemente acusada de fazer fake news –tanto por grupos de esquerda como de direita.

E assim ficamos sem conseguir nomear um dos fenômenos políticos mais relevantes de nosso tempo. E ao sermos privados do conceito, perdemos a capacidade de repudiar o fenômeno. Se até a CBN e a Folha são fake, que mal faz chamar Kim Kataguiri para escrever num jornal ou falar de segurança pública em um evento do MP?
"O homem cuja vida inteira é dedicada a realizar poucas operações simples, cujos efeitos também talvez sejam sempre os mesmos... em geral se torna tão estúpido e ignorante quanto é possível a uma criatura humana."

TIM HARFORD
DO "FINANCIAL TIMES"

Essa citação sobre o efeito estupefaciente do trabalho industrial repetitivo parece ser de Karl Marx. Mas é de Adam Smith (1723-1790), em "A Riqueza das Nações".

No mês do aniversário de morte de Smith, a ocasião é propícia para refletir sobre o filósofo escocês. Smith sabia que a especialização e a divisão do trabalho não estavam por desaparecer. Por isso advogava a criação de escolas bancadas por verbas públicas como um meio para trabalho e lazer satisfatórios.

O advento de linhas de produção em massa fez Smith parecer profético, mas muito trabalho repetitivo foi assumido por máquinas, desde então. Seu alerta é obsoleto?

"A Riqueza das Nações" foi escrito há quase 250 anos. Não esperamos que cada palavra continue válida. Mas a citação ainda ressoa -não só para quem faz trabalho repetitivo mas para o trabalhador do conhecimento, o programador, o advogado, o colunista de jornal.

Não enfrentamos a monotonia, mas a tentação da internet. Facilmente, porém, podemos cair no ciclo do que os projetistas de caça-níqueis designam "loop lúdico", repetindo ações: verificar e-mail, Facebook, Instagram, Twitter, e-mail. Repetir.

Smith nem sonhava com o smartphone, mas que melhor definição para um loop lúdico do que "realizar poucas operações simples, cujos efeitos talvez sejam os mesmos"?

Smith estava preocupado com empregos sem desafio mental: se surpresas ou problemas nunca surgem, o trabalhador "não tem ocasião de exercer sua inventividade para remover dificuldades".

Para o moderno trabalhador do conhecimento, o problema não é a facilidade de evitar desafios. O argumento é exposto pelo cientista da computação Cal Newport no livro "Deep Work". O trabalho que importa muitas vezes é difícil. Pode ser absorvente e satisfatório, mas é incômodo, causa dor de cabeça e costuma requerer recomeços.

O e-mail é mais fácil. Lendo o livro de Newport, percebi que o e-mail representa dupla tentação: ele nos liberta de tarefas árduas e ao mesmo tempo parece trabalho. Ser um ninja do e-mail parece profissional, mas muitas vezes representa um escape.

Em seu novo livro, "Micromastery", Robert Twigger elogia o domínio de pequenas competências, como não cozinhar, mas fazer o omelete perfeito. Devemos nos aprofundar -como requer Newport-, mas o domínio dessas pequenas competências é satisfatório.

Extraio três lições disso. A primeira é que aprender importa. A segunda é que trabalho sério requer esforço, e fugir disso pode ser tentador. Ter a liberdade de evitar pensamento fatigante é um privilégio, mas prefiro não abusar.

A terceira lição é que os métodos artesanais do passado nos ofereciam algo especial. Para Smith, era o desafio que vinha de resolver problemas imprevisíveis. Para Twigger, é a variedade de termos de fazer muitas coisas pequenas. Para Newport, é o fluxo que surge da imersão em uma competência que precisamos dominar. Talvez os três estejam tentando dizer a mesma coisa.

Smith percebeu que a era industrial iminente ameaçava essas alegrias do trabalho. 
A era pós-industrial também ameaça, de modo diferente. Felizmente, temos escolha.

Tradução de PAULO MIGLIACCI 

Aluno mais rico fica atrás em teste de finanças no Brasil

FLAVIA LIMA
DE SÃO PAULO

Mesmo os estudantes brasileiros mais ricos tiveram baixíssimo desempenho na prova de conhecimento de finanças, em avaliação feita pelo Pisa, teste internacional do aprendizagem de jovens conduzido a cada três anos.

Na prova de 2015, os estudantes brasileiros atingiram nota média de 393 pontos, a pior entre os 15 países avaliados nesse quesito específico, atrás do Peru (403 pontos) e do Chile (432 pontos).

Entre os três países com melhores notas no teste de finanças, dois são emergentes.

No topo do ranking, os chineses somaram 566 pontos, seguidos pelos estudantes canadenses e pelos russos.

A prova específica de conhecimentos financeiros é aplicada desde 2012, mas o Brasil fez o teste pela primeira vez em 2015.

No Pisa, as três habilidades tradicionais -leitura, matemática e ciências- são testadas há bem mais tempo, desde 2000. Na versão mais recente, reuniram 70 países.

Ana Maria Bonomi Barufi, economista do Bradesco, mostra que a variável renda tem efeito relevante não só sobre as habilidades tradicionais mas também sobre o conhecimento financeiro dos jovens em todo o mundo.

Nos 15 países analisados, uma comparação entre 25% dos estudantes mais pobres e os 25% mais ricos mostra uma diferença de ao menos 40 pontos na nota média dos alunos dos dois grupos.

A disparidade maior foi verificada na China, com um fosso de 132 pontos entre a nota média dos mais pobres e a nota média dos mais ricos.

Ainda assim, surpreende que a nota dos estudantes chineses menos favorecidos supera a dos mais ricos de países como Peru, Chile, Eslováquia, Lituânia e Brasil.

A Rússia registrou a menor diferença entre as notas de conhecimento em finanças de estudantes mais pobres e mais ricos, de 46 pontos.

No caso do Brasil, chama a atenção que mesmo os estudantes mais ricos não conseguem sobressair quando comparados a seus pares de outros países.

A nota média do grupo brasileiro com renda familiar mais alta foi de 441 pontos, a lanterna entre todos os estudantes mais ricos.

MAIS POBRES

Já os estudantes brasileiros mais pobres alcançaram nota média de 364 pontos.
Comparados apenas com estudantes de renda mais baixa de outros países, conseguem ficar à frente do Peru.

Barufi identifica ainda uma correlação positiva entre o PIB per capita -um indicador de riqueza de um país- e a nota obtida no Pisa em conhecimentos financeiros.

A comparação também mostra atraso do Brasil em relação a outros países.
Pelo nível de PIB per capita exibido pelo Brasil, a nota dos alunos brasileiros deveria ser cerca de 40 pontos maior, diz a economista.
Barufi reconhece que o nível de conhecimento financeiro do brasileiro preocupa.

Mas diz que os números devem ser vistos com cuidado porque o Brasil está, no geral, sendo comparado com países mais avançados.

De qualquer modo, diz ela, é certo que os estudantes brasileiros precisam desenvolver a habilidade, relevante para que consigam planejar melhor suas vidas e seu futuro.

Nesse jogo, a escola tem contribuição importante a dar. Eslováquia, Peru, Holanda, Lituânia e Bélgica estão entre os países que já adotaram política nacional para o ensino de finanças pessoais.

"Mas o papel tem que ser da sociedade", diz Barufi.

Enquanto tal movimento não toma corpo, alternativas para avançar na formação de jovens mais preparados para lidar com finanças podem ser formuladas, diz Barufi, como campanhas virtuais de conscientização sobre o tema. 

domingo, 23 de julho de 2017

Educação Integral para garantir qualidade e equidade: como estamos nesse caminho?

"Precisamos repensar o financiamento da Educação e articular programas da área a outras pastas como cultura, esportes, assistência social e saúde, otimizando os recursos", afirma a Fundação Itaú Social

Todos Pela Educação

Diante dos desafios a serem enfrentados no caminho para a qualidade e a equidade na Educação Pública brasileira, a ampliação da oferta de Educação Integral é uma resposta promissora. O Plano Nacional de Educação (PNE) reforça essa agenda, explicitamente na Meta 6.  Implementar políticas, no entanto, que concretizem essa maior exposição das crianças, adolescentes e jovens a situações de aprendizagem não é tarefa simples. Implica mudanças estruturais e de gestão que vão desde a infraestrutura básica para a realização das atividades até a definição de propostas pedagógicas que tragam contribuições efetivas nesse sentido, passando pela necessária formação dos profissionais envolvidos.  Essas medidas exigem a mobilização de recursos, planejamento e tempo para uma implementação de qualidade – por isso, embora o PNE vigore até 2024, é fundamental que as políticas sejam colocadas em execução o quanto antes.



Assim, um dos desafios para o cumprimento da meta 6 passa pelo financiamento. Ao longo desses três anos de vigência do plano, o processo de ampliação da cobertura da Educação Integral evidencia a forte dependência do repasse de recursos federais para a execução das atividades no âmbito dos municípios. Os dados do Censo Escolar 2016revelaram uma queda de 46,7% nas matrículas em tempo integral no Ensino Fundamental, interrompendo um ciclo virtuoso de expansão. O resultado pode ser explicado em parte pela interrupção de repasses, em 2015, do programa federal Mais Educação, fonte estratégica de recursos para muitos municípios viabilizarem sua oferta. Há locais em que a verba correspondia a toda a Educação Integral do município. A retomada dos repasses, em 2017, por meio do Novo Mais Educação pode reverter a queda, mas não soluciona a situação de forma mais permanente. Para tanto, é urgente repensar o financiamento da Educação e o papel de colaboração entre os entes federados – temas abordados na Meta 20   PDF
do PNE e suas respectivas estratégias.
Outro desafio a ser enfrentado é a articulação de programas da área de Educação com os de outras áreas, como Cultura, Esportes, Assistência Social e Saúde.  A articulação da escola com os diferentes espaços educativos, culturais, esportivos, com outros equipamentos públicos e com entidades da sociedade civil aumenta  as chances de ampliação da oferta, na medida em que também aproveita sinergias e otimiza diferentes recursos.  Ainda, a intersetorialidade eleva o próprio potencial de qualidade das ações ofertadas.  Não há dados disponíveis que monitorem o desenvolvimento geral das ações intersetoriais no País, mas elas já ocorrem em diferentes locais e sua concretização precisa ser cada vez mais priorizada. Essas parcerias nos permitem refletir cada vez mais sobre a responsabilidade de todos na melhoria da Educação.  O Plano Nacional de Educação é uma declaração desse esforço conjunto e somente com a convergência dos diversos setores de governo e com a participação das organizações da sociedade é que o cumprimento das suas metas será possível.
*Fundação Itaú Social,  organização parceira do movimento Todos Pela Educação no Observatório do PNE.

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Aprender a programar, programar para aprender

Mozart Neves
Diretor de Articulação e Inovação do Instituto Ayrton Senna. Foi reitor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), secretário de Educação de Pernambuco (2003-2006) e presidente do Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação). Foi presidente executivo do Todos Pela Educação (2007-2010)

É inegável a revolução que a tecnologia tem provocado na vida contemporânea, seja no modo como vivemos, trabalhamos ou nos relacionamos. Na educação, essa mudança não poderia ser diferente. Num artigo anterior (leia aqui), já havia falado sobre como as tecnologias digitais têm proporcionado novas possibilidades ao processo de ensino e aprendizagem, provocando, assim, transformações na escola e no que se espera dela.
Uma tendência, em especial, tem ganhado muita relevância ao redor do mundo: o ensino da programação de computadores a estudantes.  Em países como AustráliaReino Unido, Canadá e  Estados Unidos, a computação e a criação de tecnologias digitais têm sido integradas às bases curriculares de toda a Educação Básica.
Mas quais são as motivações por trás da integração da programação de computadores ao ambiente escolar? Um interessante artigo publicado pelo jornal norte-americano The New York Times  em junho, questiona a influência das grandes empresas de tecnologias nesse processo. Estaria essa tendência mais atrelada a uma demanda por formação técnica/profissional, condicionada aos grandes interesses da indústria?
Em cenários complexos, resgatar o passado sempre ajuda a entender o presente e pensar o futuro. Nesse sentido, a equipe do Instituto Ayrton Senna esteve presente no IDC 2017, um evento focado no design de tecnologias para crianças, realizado em Stanford, nos Estados Unidos.
Entre os aprendizados trazidos pela equipe está o entendimento de que o uso da programação de computadores é também uma prática eficaz para o desenvolvimento de competências, como resolução de problemas, criatividade e colaboração. Em outras palavras, ela também ajuda a promover a Educação Integral.
No Brasil, iniciativas como o PernambucodersComputação na EscolaProjeto Rope  e o Letramento em Programação, do Instituto Ayrton Senna, demonstram foco no desenvolvimento de competências mais amplas que habilidades técnicas, melhorando a relação do aluno consigo, com seus pares e com a escola. São projetos que já estão implementados em algumas redes públicas de ensino, em diferentes estados.
Portanto, é inegável dizer que a integração da programação ao ambiente escolar ajuda a ampliar o horizonte de crianças e jovens sobre suas possibilidades de futuro, podendo até atraí-los naturalmente para uma carreira mais técnica ou relacionada à tecnologia. Entretanto, o principal foco dessas ações deverá ser a promoção de uma educação plena, buscando desenvolver o potencial dos estudantes.
Como define muito bem Mitchel Resnick, pesquisador do MIT, aprender a programar “não pode ser visto apenas como um caminho para bons empregos, mas como uma nova forma de expressão e um novo contexto de aprendizagem”.

Competência socioemocional é demanda para novo ensino médio, dizem especialistas

Conteúdo cobrado até em alguns vestibulares, habilidades como cooperação e responsabilidade são importantes na formação do adolescente

Tulio Kruse, Especial para o Estado
Habilidades que não são ensinadas com giz e lousa - como responsabilidade, estabilidade emocional, extroversão, empatia e resiliência - deixaram de ser assunto restrito às pesquisas acadêmicas. Elas já são avaliadas como critério de seleção em vestibulares e desenvolvidas de forma dispersa em colégios das redes pública e particular. Em meio às expectativas com a reforma do ensino médio e a proposta da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para a etapa (que definirá o que cada aluno deve aprender nesse período escolar), educadores ouvidos pelo Estado defendem que o tema ganhe mais espaço em disciplinas obrigatórias dessa etapa e na formação de professores.
O desenvolvimento das competências socioemocionais na escola durante essa fase é considerado estratégico por especialistas. Essas habilidades auxiliam em processos como a formação de identidade – que atinge seu ápice entre os 14 e 18 anos –, na tomada de decisões e na transição para a vida adulta. Além disso, têm sido cada vez mais cobradas no acesso ao ensino superior.
Nos dois últimos anos, entrevistas e até dinâmicas de grupo foram incluídas na seleção dos vestibulares de Direito e Administração na Fundação Getulio Vargas (FGV), de Medicina na faculdade do Hospital Albert Einstein, e dos cursos de Engenharia do Insper, entre outros, com o objetivo de avaliar competências socioemocionais.
O assunto também fez parte da última edição do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), em 2015, que examinou alunos de 15 a 16 anos em 70 países. A capacidade de "solução colaborativa de problemas" foi testada ao lado de conhecimentos em ciências, leitura e matemática. Nessas três categorias, o Brasil ficou entre as piores posições do ranking, variando entre a 59.ª e 65.ª posição. Os resultados da avaliação socioemocional ainda não foram divulgados.
"A adolescência é um momento muito rico do ponto de vista socioemocional, de transformação muito intensa na formação humana", diz a psicopedagoga Anita Abed, que desenvolveu um estudo para a Unesco em 2014 com o intuito de guiar política públicas sobre o tema. Para ela, o currículo do ensino médio deveria separar disciplinas específicas para o desenvolvimento socioemocional. “O ideal seria a escola inserir, na grade curricular, uma disciplina em que o conteúdo seria ‘habilidades cognitivas, sociais, emocionais e éticas’.”
O orientador educacional do ensino médio no colégio Vértice, Luís Otávio Targa, concorda. “Acho essencial que essas habilidades estejam na base curricular, porque todo mundo tem necessidade de ser escutado, de falar, de estar num ambiente acolhedor e respeitoso”, ele argumenta. “As habilidades socioemocionais aceleram o processo (de aprendizado).”
Exemplos. A ideia tem sido implementada de formas diferentes nos colégios. Em unidades de ensino integral da rede pública paulista, por exemplo, os alunos formam ‘clubes juvenis’ em que organizam projetos a partir de seus interesses pessoais, e há oficinas coletivas de tutoria em que desenvolvem ‘projetos de vida’, com discussão sobre planos para o futuro. Em colégios particulares, essas habilidades estão mais ligadas a projetos em grupo e disciplinas eletivas.
No Vértice, alunos do 2º ano do ensino médio desenvolveram um projeto que simula a criação de uma escuderia de Fórmula 1, com propostas de marketing, setor financeiro e modelos próprios para carros em miniatura. A equipe acabou premiada na etapa nacional da competição ‘F1 in Schools’.
“Tenho plena certeza que só consigo chegar ao grau de profundidade que estabeleço nas minhas aulas em Biologia, por exemplo, porque meus alunos vêm desenvolvendo habilidades socioemocionais”, diz Targa, orientador educacional da escola.
A Móbile, escola da zona sul de São Paulo, oferece ao menos três matérias eletivas especificamente para desenvolver essas habilidades no ensino médio. Nas aulas de Robótica, ‘Criação de Engenhocas’ e ‘Conexões’, os alunos se organizam em grupos e exercitam organização e argumentação ao criar projetos de engenharia e apresentar seminários. Por iniciativa própria, os estudantes também organizaram circuitos de debates sobre atualidades.
“Quando a FGV mudou o vestibular de Direito, a Móbile nem precisou preparar os alunos”, diz o diretor de ensino médio da escola, Wilton Ormundo. “Argumentar e contra-argumentar de forma segura já era algo que eles tinham trabalhado bastante.”
Professor. O consenso entre educadores ouvidos pelo Estado é que a formação de professores será o maior gargalo para o desenvolvimento de competências socioemocionais no ensino médio. Isso porque o objetivo não pode ser alcançado com o formato de aula tradicional, em que os alunos apreendem o conteúdo de forma passiva.
“Você não ensina habilidade socioemocional pelo discurso. Ela é desenvolvida com vivências”, diz a psicopedagoga Anita Abed. Para resolver o problema, ela sugere que escolas e secretarias de ensino criem processos mais sofisticados de supervisão, aconselhamento e formação continuada. 
Especialistas alertam que o planejamento para contemplar essas competências na formação do aluno não é tarefa fácil. Na Móbile, foram dois anos de reuniões semanais para se chegar a um modelo considerado satisfatório. A metodologia das aulas ainda está em processo de revisão e deve ser aperfeiçoada, segundo o diretor educacional do ensino médio. 
“O professor nesse caso tem o papel de mediador e não de detentor absoluto do saber, ele divide o saber com os alunos”, diz Ormundo. “Você precisa de uma capacitação constante para isso.”

quarta-feira, 19 de julho de 2017

Estamos avançando na construção de uma gestão educacional democrática?

" ", afirma Beatriz Cortese, coordenadora de projetos do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária

Todos Pela Educação
A participação social é um direito humano e sua efetivação no cotidiano escolar é fundamental para a formação cidadã de crianças, adolescentes, jovens e adultos, conforme previsto na Constituição e na LDB.  O Plano Nacional de Educação (PNE), em seu artigo 9º e em sua Meta 19, reafirma esse princípio e vai além ao estabelecer com maior clareza as políticas de gestão democrática. Entre as estratégias previstas estão:
  • Aprovação de legislações específicas, por estados e municípios, para regulamentar a gestão democrática em suas áreas de abrangência;
  • Escolha de gestores educacionais por processos que conciliem critérios técnicos de mérito e desempenho à participação da comunidade;
  • Ampliação de programas de apoio e formação de membros dos conselhos de acompanhamento e controle social da área educacional;
  • Criação de fóruns permanentes de educação em todas as esferas;
  • Estímulo à constituição e o fortalecimento de grêmios estudantis e associações de pais;
  • Constituição e o fortalecimento de conselhos escolares e conselhos municipais de educação;
  • Participação e a consulta de profissionais da educação, alunos e seus familiares na formulação dos projetos político-pedagógicos das escolas;
  • Programas de formação de diretores e gestores escolares.
Essas estratégias visam reafirmar alguns princípios, garantir a regulamentação e o estímulo à construção de mecanismos e instâncias de gestão democrática. Monitorar a efetivação desta meta e de suas estratégias é um imenso desafio, isto porque não é possível analisar a qualidade da participação social apenas por meio da existência de órgãos colegiados, leis ou programas. A construção de novos indicadores não só quantitativos, como qualitativos, precisa ser objeto de debate público.

Garantir acesso de jovens de 15 a 17 anos depende de políticas focalizadas

"Tornar o Ensino Médio mais atrativo, com a diversificação do currículo, e garantir melhor qualidade com a Base Nacional Comum Curricular, são passos importantes e necessários", afirma o Todos Pela Educação


Todos Pela Educação

Até 2006, a legislação brasileira determinava a obrigatoriedade da matrícula para crianças e adolescentes entre 7 e 14 anos, passando, neste ano, a adiantar essa faixa etária para os 6 anos de idade, com a ampliação do Ensino Fundamental, antes de 8 para 9 anos. Já em 2009, a Emenda Constitucional (EC) n° 59 promoveu a expansão do direito de acesso à Educação Básica Pública, tornando obrigatória a matrícula para toda a população de 4 a 17 anos. Incorporada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e nas metas 1, 2 e 3 do Plano Nacional de Educação (PNE), sancionado em 2014, a EC 59 deu a estados e municípios até 2016 para garantir a universalização da Educação Infantil e do Ensino Médio, etapas correspondentes às faixas de 4 e 5 anos, e 15 a 17.
De acordo com levantamento do Todos Pela Educação com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad/IBGE), o País tem 1.543.713 jovens de 15 a 17 anos fora da escola – eles representam 60% dos 2,5 milhões de toda a população de 4 a 17 anos nessa situação. Como esses números, os mais recentes, são de 2015, ainda não é possível afirmar se o país cumpriu ou não a determinação, mas pela trajetória dos indicadores, a podemos deduzir que não, uma vez que não houve nenhuma política pública específica para atrair esses jovens para a escola.
Desde 2009, quando a EC 59 foi aprovada, tanto o número de matrículas, quanto o número de jovens dessa faixa etária fora da escola e os percentuais de atendimento demonstram estagnação, oscilando de forma que não é possível estabelecer uma tendência de crescimento
Tão preocupante quanto a estagnação é a constatação de que esses números escondem uma realidade cruel de desigualdades relacionadas à renda, raça/cor e localidade desses jovens. Enquanto 95,7% dos jovens pertencentes ao quartil (25%) de famílias mais ricas da população estão matriculados, essa taxa cai para 81,5% entre os do quartil mais pobre. Ao passo que 85,3% dos que residem em zonas urbanas tinham acesso à escola, na zona rural essa taxa era de 79,6%. Já em relação à raça/cor, os brancos chegaram a 87,1% na taxa de atendimento, percentuais acima dos pretos, que apresentaram 81,7%, e dos pardos, 82,7%.
É preciso reconhecer, contudo, que apesar de ainda persistente, as disparidades nesses três aspectos têm diminuído desde 2005, o que pode ser considerado positivo em um País com um histórico de profundas desigualdades raciais como o Brasil.
Os dados mostram, ainda, que no período de 2005 a 2015 houve aumento das porcentagens daqueles que apenas estudam e consequente queda nas demais. Em 2015, 67,8% da população nessa faixa etária dedica-se somente aos estudos, enquanto 15,9% trabalha e estuda, 6% só trabalha e 10,2% não estuda nem trabalha.
É dever do poder público atender a demanda, oferecendo vagas para todas as faixas etárias previstas na legislação. Deve ser feito um levantamento minucioso das necessidades desses jovens para que eles sejam atendidos pelas unidades de ensino – especialmente se forem jovens com deficiência, indígenas, quilombolas, moradoras de regiões de difícil acesso ou de alta vulnerabilidade social. Porém, não basta apenas os governos oferecerem as vagas. É fundamental que existam políticas focalizadas para garantir a permanência desses jovens na escola, sua aprendizagem e a conclusão do Ensino Médio. Os indicadores mostram que a taxa de jovens de 15 a 17 anos matriculados no Ensino Médio é de apenas 56,4%, enquanto 18% deles ainda está no Ensino Fundamental e 14,6% fora da escola.
Tornar o Ensino Médio mais atrativo, com a diversificação do currículo, e garantir melhor qualidade com a Base Nacional Comum Curricular, são passos importantes e necessários. É imprescindível que essas políticas sejam bem desenhadas e implementadas, para que tragam resultados positivos para a garantia do direito dos jovens à Educação de qualidade. Além disso, são fundamentais e urgentes políticas que considerem os anos finais do Ensino Fundamental, etapa na qual os indicadores de aprendizagem e fluxo escolar começam a piorar, e também políticas estruturantes, como a formação e valorização docente e melhoria das condições de acesso e infraestrutura escolar para alunos e toda a equipe escolar.