domingo, 29 de janeiro de 2017

Especial pós-graduação - Vagas aumentam, mas incertezas rondam pós-graduação no Brasil

NÁDIA PONTES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Uma pergunta acompanhou Giovanny Kley Silva Trindade, 29, durante a graduação em serviço social: por que as pesquisas sobre problemas sociais em seu Estado, Acre, eram tão escassas?

Com a ideia de estudar a fundo questões como racismo e pobreza, ele buscou um mestrado logo que se formou. Mas a falta de programas no Acre o obrigou a mudar os planos e fazer especialização numa faculdade particular.

"Eu gostaria de ser professor, mas está ficando ainda mais difícil com as perspectivas de cortes e cancelamento de concursos públicos nos próximos 20 anos", disse, fazendo referência à PEC 55, que limita gastos públicos.

O Acre foi um dos últimos Estados a ter cursos de pós-graduação no país. A turma inaugural de mestrado, formada em 2002, teve dez alunos. Doutores ainda estão a caminho: o único programa ativo é o de Ciências Agrárias, da Universidade Federal do Acre, que deve titular os primeiros alunos em 2018.

A distribuição irregular da oferta pelo território nacional ainda é um desafio que o atual Plano Nacional de Pós-Graduação, que se estende até 2024, tenta resolver.
São Paulo é o Estado campeão em número de programas, com 869, seguido pelo Rio de Janeiro, com 452. Amapá e Rondônia têm, respectivamente, 4 e 10.

Questionada, a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) não se manifestou.

MAIS ALUNOS

Segundo os dados mais recentes, 325.230 alunos se matricularam em cursos de pós-graduação em 2015, o dobro do registrado em 2005. O número de cursos também aumentou nesse intervalo -saltou de 2.057 para 3.905.

Apesar da ampliação, a ANPG (Associação Nacional de Pós-Graduandos) diz que o clima é de receio e incertezas. "Não sabemos se os investimentos que foram feitos nos últimos anos irão continuar", diz Tamara Naiz, presidente da associação e doutoranda em história.

Segundo Naiz, medidas como a PEC 55 significam corte de bolsas, interrupção de pesquisas e não pagamento de editais. "É raro ter atraso de bolsa, mas acontece. E existe uma insegurança sobre a continuidade do benefício."

O orçamento da Capes, que engordou de R$ 6,1 bilhões em 2014 para R$ 7,4 bilhões em 2015, encolheu no ano passado para R$ 5,3 bilhões.
Ainda não se sabe quanto o órgão receberá neste ano.

De 2014 para 2015, mais mestres e doutores saíram das universidades brasileiras -um aumento de 5%, totalizando 65.142.

Bahia
1
77
São Paulo
27
Rio de Janeiro
18
Minas Gerais
17
Rio Grande do Sul
3
Santa Catarina
2
Distrito Federal
1
Bahia

3.905 programas de pós-graduação stricto sensu existem no Brasil, entre mestrado e doutorado

621 programas de mestrado e doutorado do Brasil são na área de ciências da saúde, a campeã de ofertas, seguida por cursos multidisciplinares (609)

9 dos 11 programas de pós-graduação stricto sensu de Roraima são classificados com a nota mínima exigida pela Capes (3); é o Estado com as piores notas do país*

4 programas de pós-graduação existem hoje no Amapá, Estado com o menor número de cursos de mestrado e doutorado do país

R$ 5,8 bi foi o orçamento previsto pelo governo para a Capes em 2016, 21% a menos do que em 2005 (R$ 7,4 bilhões); a verba para 2017 ainda não foi divulgada


Para Ana Maria Carneiro, pesquisadora do Laboratório de Estudos de Educação Superior da Unicamp, isso ajudou a estruturar as pesquisas nas universidades, mas a absorção desses especialistas pela academia tem limites.

Para evitar uma legião de mestres e doutores desempregados, uma saída seria investir em cursos de especialização e mestrados voltados para o mercado. "Existe uma certa cisão com o setor produtivo. Este é um lado deficitário no Brasil", diz Carneiro.

Naiz tenta enfrentar o desânimo para seguir com suas pesquisas na área. "Fazer ciência no Brasil não é fácil, é quase um altruísmo: você deixa de entrar no mercado de trabalho para viver com uma bolsa de R$ 1.500. E o Brasil não está dando sinais positivos para quem tenta desenvolver esse país", afirma.

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