DE SÃO PAULO



Para que Ana Paula, 3, pudesse ser uma criança com mais liberdade, sem precisar se rastejar para alcançar um brinquedo ou para brincar de esconde-esconde, ela ganhou um modelo de cadeira de rodas inédito no país, que a deixa quase na altura do chão.
E quem desenvolveu esse veículo, que parece um carrinho de corrida estilizado, foi o próprio pai da menina, Mario Alvitti, 33.
Ana tem uma deficiência que a deixou paraplégica. Por isso, para melhorar a qualidade da infância da filha, Alvitti largou a carreira militar e torrou as economias guardadas ao longo da vida, R$ 30 mil.
Para desenvolver todo o projeto, com design, escolha dos materiais ideais, pesquisa, patente e fabricação, o pai contou ainda com a ajuda de amigos, que doaram mais R$ 40 mil para que o sonho fosse concretizado.
"As cadeiras de rodas infantis são para deslocamentos maiores. Elas não dão a segurança e a comodidade que ela precisava para pegar uma boneca no chão, para se deslocar rapidamente pela casa, para explorar o ambiente. Isso me tirava o sono", afirma Alvitti.
Ele demorou um ano para fechar o projeto, que já tem a patente requerida e será lançado em uma grande feira de empreendedores e inovações, a partir do dia 18 deste mês.
PAREDE RISCADA
Quando Ana tinha oito meses de idade, uma lesão tirou da pequena os movimentos das pernas e parcialmente do tronco. Trata-se de uma lesão medular não traumática, sem um choque físico e cujas causas ainda são investigadas.
Ela também perdeu a sensibilidade tátil da cintura para baixo, o que comprometeu funções fisiológicas.
Mas o que o trauma parece não ter tirado da garotinha é a fofice, claro, a tagarelice infantil (fala pelos cotovelos) e uma inquietação de descobrir o mundo -ela se movimenta na cadeirinha por todos os cômodos da casa, pela escola e nas áreas planas do condomínio onde mora, na zona oeste de São Paulo.
"A ficha de que ela não pode andar parece que ainda não caiu para a gente. É difícil de assimilar. O que nos sustenta e nos conforta é que ela é uma menina cheia de vida, alegre", diz o pai.
A mãe de Ana Paula, Fernanda Cristina Caldeira Leitão Teixeira, 35, é fisioterapeuta e também ajudou na criação do conceito e da ergonomia da cadeira.
"A Ana ganhou uma autonomia fantástica e teve crescimento cognitivo podendo tatear o chão, alcançar as coisas. Quando ela riscou a parede pela primeira vez, o que conseguiu usando a cadeira, foi uma alegria", afirma.
O pediatra Emanuel Sarinho, presidente do Departamento Científico de Alergia da Sociedade Brasileira de Pediatria, elogiou a iniciativa do pai de Ana Paula.
"O pai da criança, com sua sabedoria afetiva, abraça a lógica biológica e o conhecimento científico atual"diz.
Sarinho explica que "o contato da criança com bactérias probióticas nas fases iniciais da vida promove no intestino, e em outros sistemas orgânicos, uma verdadeira harmonia no sistema imunológico".
Ainda segundo o médico, "ver o verde, admirar o céu, fazer brincadeiras ao ar livre são poderosos estímulos ao desenvolvimento afetivo e psicomotor fazendo com que a criança apresente experiências marcantes e positivas.
CHANCE DE BRINCAR
A "Fly Children", nome de registro da cadeirinha, é indicada para crianças de 1 a 4 anos e atende a diversos tipos de deficiências, como as provocadas pela paralisa cerebral ou pela mielomeningocele, de acordo com os idealizadores do projeto.
O veículo pesa 8,5 kg -não pode ser muito leve para manter a estabilidade e segurança da criança- e é feito de um material atóxico, não inflamável e flexível, o que propõe conforto ao usuário.
A intenção do projeto é ser autossustentável. A cadeira custa R$ 2.000. Até agora, foram feitas apenas seis unidades, e todas foram doadas.
"Não tenho nenhum objetivo de ficar rico vendendo essa cadeira. Quero que mais crianças tenham a chance de poder brincar mais livremente, de mais pais poderem ficar felizes com o desenvolvimento de seus filhos", declara o pai da menina.
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