segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Querer preparar a carreira da criança hoje é perda de tempo

Emma Jacobs é colunista do "Financial Times". Excepcionalmente hoje não publicamos a coluna de Lucy Kellaway

Certa vez conheci uma consultora cujo trabalho era encontrar vagas para crianças abastadas nas melhores creches e escolas. Um de seus clientes havia mapeado a vida do filho com precisão. O garoto iria cursar a Universidade de Cambridge antes de partir para uma carreira na área de banco de investimentos no Deutsche Bank. O filho tinha apenas seis anos. 

A ambição do pai me pareceu absurda quando tomei conhecimento dela. Quem é que olha para a carinha rechonchuda de seu bebê, ouve sua risada e pensa "esse vai ser um especialista em planilhas"? Decorrido um ano, isso parece ainda mais absurdo. Afinal, o Deutsche Bank está eliminando 9.000 empregos. 

Mesmo assim, confesso ter pensamentos prematuros sobre a futura carreira de meu próprio filho. Quando ele começou na escola neste ano letivo, fiquei meio apavorada com sua iniciação na engrenagem institucional. Meu trabalho é escrever sobre trabalho e carreiras e sou assolada diariamente por previsões de automação disseminada e desemprego em massa. Me vejo imaginando como preparar da melhor maneira possível um filho para o futuro. Deve haver um caminho mais ensolarado a se percorrer do que estocar alimentos enlatados e fazer cursos de sobrevivência. 

A maioria das mães e pais começa a partir de suas próprias experiências ­ profissões e negócios administrados pela família. Um estudo feito pelo Facebook este ano constatou que "as pessoas de uma família têm uma propensão maior a escolher a mesma ocupação". 

Mesmo assim, a pesquisa também constatou que "embora um filho que tenha um pai militar tenha uma probabilidade cinco vezes maior de seguir o mesmo caminho, apenas um em cada quatro filhos de militares realmente faz isso". Em outras palavras, a maior parte dos filhos segue seu próprio caminho. 

Esta é uma boa notícia para o meu filho. Adoro o jornalismo, mas eu não o encorajaria a seguir a trabalhar em um setor que vem sendo convulsionado por uma angústia existencial que é frequentemente descrita como em declínio terminal, na medida em que os anúncios vão se evaporando. Quem sabe se haverá humanos escritores daqui a 20 anos? A automação está acabando com os empregos em setores que vão do industrial ao financeiro e firmas de advocacia. Meu ofício pode muito bem ser o próximo. 

Não estou sozinha nessa preocupação com a possibilidade de um filho seguir meus passos. Nick Clegg, ex­vice­premiê do Reino Unido, disse a um entrevistador: "O primeiro e mais visceral instinto que você tem enquanto pai é proteger os filhos e a política é uma coisa muito dura, conforme você já sabe". 

Contadores, vendedores de lojas e médicos poderiam dizer a mesma coisa. Em todo caso, a maioria das crianças preferiria "morrer"­ para citar adolescentes de todas as partes do mundo a ser como seus pais e mães. 

Além de encorajá ­los, ou desencorajá ­los, em suas profissões, como os pais deveriam preparar os filhos para a vida profissional? Professores e empresas exortam os jovens a se prepararem para o futuro estudando ciências, tecnologia, engenharia ou matemática. Os fabricantes de brinquedos e empresários estão se aproveitando dessa tendência. As meias de Natal serão recheadas com brinquedos vendidos sob a promessa de transformar o pequeno Poppy ou Johnny no próximo Mark Zuckerberg. 

Mas não estou convencida de que todos podem ou deveriam ser um programador. Conforme observou Martin Ford, autor do livro "The Rise of the Robots", a rotina do desenvolvimento de softwares está sendo automatizada em todo lugar. Talvez os pais devessem ser direcionados, como aconteceu com o pai e a mãe de Chris Puckett. Este ano, conheci o senhor Puckett, que fez uma carreira fantástica e ganhou muito dinheiro como comentarista esportivo, atuando como mestre de cerimônias em competições de videogame, em eventos ao vivo e na tela. 

Seu pai é um vendedor de papel e sua mãe uma recepcionista na igreja da cidade onde ele nasceu. Eles ficaram preocupados com a decisão do filho de trancar a matrícula na escola para tentar uma carreira que lhes parecia estranha. Para afastar os temores dos pais, Puckett passou a convidá­los para os torneios. Hoje, eles são seus maiores incentivadores. 

Há quem leve a coisa ainda mais longe que os Puckett. Marc Freedman, fundador de uma iniciativa social que defende segundas carreiras na fase posterior da vida profissional, vem registrando um número crescente de pais que acompanham os filhos nas carreiras que eles escolheram. Em meio ao pessimismo com o futuro do trabalho, acho isso encorajador. 

Se, desfigurando uma citação de LP Hartkley, o futuro é um país estrangeiro ­ eles fazem as coisas de maneira diferente lá, então talvez as gerações futuras sejam o nosso melhor guia. Portanto, com isso em mente, prometo apoiar meu filho em sua ambição de ser um policial espacial. Sei lá, talvez eu o acompanhe. 

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