quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Ouvir aluno foi chave para mudar ensino na Finlândia


Tiina Tahka, educadora finlandesa: reformas feitas em cooperação com alunos

Por Ligia Guimarães

Ouvir alunos antes de realizar grandes mudanças na educação é chave para evitar a rejeição popular, como as ocupações de escolas que ocorrem no Brasil em protesto contra a reforma do ensino médio proposta pelo governo. Foi assim no caso da Finlândia, conhecida por ter um dos melhores sistemas educacionais do mundo, afirma a educadora Tiina Tahka, que no ano passado coordenou a elaboração de um currículo nacional para o ensino médio finlandês.

"Todas as reformas importantes foram feitas em cooperação com os alunos", afirma Tiina, diretora da Upper Secondary School Unit, braço do governo dedicado ao ensino médio no Distrito Nacional de Educação Finlandês (FNBE), que implementa as políticas educacionais nacionais. "Todos os principais atores da educação, estudantes, professores, e municípios participaram juntamente da elaboração do currículo nacional", diz a especialista, que afirma que o governo finlandês se preocupou em sanar as dúvidas e reclamações dos alunos ao longo do processo. "Conseguimos resolver a preocupação dos alunos e eles se tornaram nossos defensores. Então eles estavam conosco, e não contra nós", afirma Tiina, que diz que, quando todos os atores da educação estão envolvidos na reforma, todos ficam do mesmo lado. A especialista participa hoje de seminário sobre propostas de currículo do ensino médio, promovido pelo Instituto Unibanco e pelo Conselho Nacional de Secretários de Educação. 

Os dois países têm realidades bem distintas ­ a Finlândia tem 5,5 milhões de habitantes, renda per capita anual de US$ 41.974 e educação gratuita em todos os níveis. "É impossível copiar um sistema de ensino de um país para outro, porque cada um tem diferenças culturais e experiências que influenciam a educação", diz Tiina. Ela vê, no entanto, práticas bemsucedidas da Finlândia que podem servir de inspiração no Brasil. 

Na reforma do ensino médio brasileiro, por exemplo, Tiina vê similaridade no esforço em flexibilizar o currículo. "Aplicamos mais flexibilidade ao sistema ao longo dos últimos 20 anos. E cada vez em que mudamos houve um debate sobre se os estudantes podiam lidar com tanta flexibilidade", explica Tiina. Para evitar que o aluno se arrependa ou limite sua formação por escolher que disciplinas deixar de fora, o governo criou a figura do orientador educacional, que conversa com cada aluno individualmente sobre seu currículo. "Os estudantes provaram que são capazes de lidar com flexibilidade, desde que tenham apoio suficiente". Na Finlândia, o currículo do ensino médio é desenhado para o período de três anos, mas os alunos podem concluí lo em 2 a 4 anos. Quem conclui o ensino fundamental obrigatório pode cursar o ensino médio superior regular e o ensino médio profissional. A valorização dos professores, tanto em salário quanto em apreciação da sociedade, está na base do sucesso do modelo finlandês. 

Diferentemente do Brasil, a evasão de alunos no ensino médio da Finlândia é quase nula, "menor que 4%". Quando um aluno falta à aula, o orientador educacional liga para saber se está tudo bem. Outro foco importante da educação finlandesa é garantir oportunidades iguais a todos. Há cursos preparatórios para imigrantes, por exemplo, para que entrem no ensino médio em igualdade de condições. "Queremos que todos os alunos do ensino básico continuem seus estudos, para que não deixemos nenhum para trás. Mas claro que a realidade é muito diferente da do Brasil", pondera.

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