terça-feira, 6 de setembro de 2016

A urgência de se trazer a educação para o debate eleitoral

Cabe a nós, pais, alunos, organizações sociais e os demais setores da sociedade, mostrarmos aos políticos que precisamos ter responsabilidade com o futuro do país. 

Maria Alice Setubal



Ao ver alguns programas do horário eleitoral e os debates entre candidatos à prefeitura de São Paulo, reparei na invisibilidade das propostas sobre educação. Temas como saúde, emprego e segurança são aqueles que aparecem com maior frequência nas pesquisas de opinião, segundo analistas políticos, e portanto estão muito presentes na agenda dos candidatos. Já quando as pesquisas de opinião tratam da educação, a falta de creches é o ponto mais citado pelos eleitores, e acaba por dominar o debate. Claro que o problema da falta de vagas em creches é urgente e deve ser resolvido o quanto antes. Mas políticos que concorrem ao cargo de prefeito deveriam ter clareza sobre a importância da educação para o desenvolvimento do Brasil, e abordar com seriedade diversos aspectos ligados à ela em suas campanhas.
Participei no sábado de um programa na rádio CBN sobre a educação na cidade de São Paulo juntamente com as educadoras Dagmar Garroux e Ilona Becskeházy, sob a coordenação de Fabíola Cidral. Na conversa, pudemos debater as prioridades da área para a cidade de São Paulo. 
As pesquisas realizadas pelos órgãos governamentais têm apontado de forma recorrente que a maioria das capitais brasileiras apresenta índices bastante precários de aprendizagem, e São Paulo, infelizmente, não foge a essas estatísticas. Embora dados do último Saresp tenham mostrado uma pequena melhora dos alunos da rede estadual paulista em 2015, os resultados estão longe de serem os desejados. O Brasil ainda é o segundo país com pior nível de aprendizado, de acordo com estudo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Mas como os candidatos poderiam reverter esta situação tão complexa? Felizmente, eles contam com um documento que poderá guiá-los nesta tarefa. Em 2015, foi aprovado e sancionado o Plano Municipal de Educação de São Paulo, com diretrizes que buscam cobrir as defasagens relativas aos nossos déficits de infraestrutura, aprendizagem, currículo e valorização de professores. Além disso, o Plano é regido pelos princípios de equidade, superação das desigualdades, direitos humanos, cidadania e erradicação de formas de discriminação, formação para o trabalho, novas tecnologias, sustentabilidade ambiental, gestão democrática. Dentre as 13 metas do Plano Municipal de Educação, destaco a meta de número 13 para discutir quais deveriam ser as prioridades do novo prefeito:
"Elaborar planos regionais de educação, no prazo de 2 anos, que deverão observar as metas e estratégias do Plano Municipal de Educação e diretrizes da SME, além de adequar as suas metas e estratégias específicas às particularidades de cada região, visando reduzir as desigualdades e promover a melhoria na qualidade do atendimento à população, em especial nas áreas mais desfavorecidas."
Assim, podemos ver que o aspecto das diferenças regionais dentro da cidade de São Paulo deve ser abordado, inclusive quando o tema é a educação. Corroborando com esta ideia, o estudo "Mapa da Desigualdade 2016", divulgado recentemente pela Rede Nossa São Paulo, aponta para as enormes desigualdades entre as diferentes regiões da cidade na oferta e qualidade dos serviços oferecidos aos cidadãos. Alguns distritos não possuem nem mesmo leitos hospitalares ou atendimento de emergência para os seus moradores.
No caso da educação, os índices de aprendizagem das avaliações nacionais e estaduais apontam na mesma direção. Considerando-se que as regiões de maior vulnerabilidade social abrigam de 30% a 40% de nossos alunos, alcançar uma educação de qualidade implica em enfrentar as desigualdades educacionais em todos os locais. 
Por isso, os territórios devem ser levados em conta na implementação de políticas que tenham como objetivo universalizar os direitos de todos e alcançar maior equidade. A implementação de políticas diferenciadas para territórios de alta vulnerabilidade significa considerar a história, valores, níveis educacionais e instituições de cada lugar, para que se possa ofertar uma educação de qualidade para todos.
Políticas específicas que busquem enfrentar as desigualdades devem se nortear por aspectos como:
  • A oferta de vagas na educação infantil e de programas com foco nas famílias;
  • A valorização e a formação continuada de professores, de modo a oferecer os melhores docentes a regiões com maiores dificuldades;
  • Programas de reforço escolar e aceleração de aprendizagem para enfrentar as distorções idade/série, evasão e repetência;
  • Currículo articulado com Educação integral;
  • Gestão Democrática com participação da comunidade escolar e atividades de convivência pautadas pela diversidade cultural;
  • Formação de redes de proteção social, de modo a articular parcerias nos micro territórios entre os órgãos e equipamentos da saúde, assistência, justiça, esportes e cultura. 
O desafio para os futuros prefeitos é grande e complexo. Mas experiências nacionais e internacionais têm mostrado bons caminhos para a melhoria da qualidade da educação e a redução das desigualdades na área. Em 2013, os movimentos das ruas pediam melhorias na educação. Em 2015 e 2016, os jovens ocuparam as ruas e escolas demandando uma educação de qualidade e conectada com o mundo contemporâneo. Cabe a nós, pais, alunos, organizações sociais e os demais setores da sociedade, mostrarmos aos políticos que precisamos ter responsabilidade com o futuro do país. 
MARIA ALICE SETUBAL, a Neca Setubal, é socióloga e educadora. Doutora em psicologia da educação, preside os conselhos do Cenpec e da Fundação Tide Setubal e pesquisa educação, desigualdades e territórios vulneráveis.

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