terça-feira, 6 de setembro de 2016

O relacionamento da escola com a comunidade vai mal

Rosely Sayão

Psicóloga e consultora em educação, fala sobre as principais dificuldades vividas pela família e pela escola no ato de educar e dialoga sobre o dia a dia dessa relação. Escreve às terças-feiras.

06/09/2016  02h09

Se prestarmos atenção, veremos que o relacionamento da escola com a comunidade vai mal, muito mal! E eu me refiro aqui tanto ao relacionamento amplo —ideias coletivas a respeito da atuação da escola na educação— quanto ao específico, ou seja, de cada unidade escolar com sua sociedade.

Esse fato não é bom para a educação e isso nos torna responsáveis por refletir a respeito do tema, já que a formação escolar interfere no desenvolvimento integral de nossas crianças e adolescentes e, por esse motivo, trará consequências para o futuro deles.

Já tratei aqui do que tem sido chamado de "judicialização da educação", que significa, principalmente, a interferência do Judiciário em questões que deveriam ser resolvidas pelas partes envolvidas. Mas, essa intervenção tem ocorrido justamente pela falta de diálogo entre escola e comunidade. E por quê?

Primeiramente, porque a instituição escolar ainda está colada à ideia tradicional de que ela não precisa prestar contas à comunidade sobre o trabalho que realiza. A escola precisa, sim, prestar contas. As famílias não podem nem devem confiar cegamente na escola.

Quando um filho é matriculado na escola, independentemente de ela ser pública ou particular, a família tem o direito de saber qual tipo de educação escolar será realizada e se ela surte os efeitos esperados. A família tem, inclusive, o direito de questionar e problematizar essas questões.

Ocorre que, em geral, quando a escola não atinge as metas que ela mesma estabelece com seu alunado, costuma creditar a eles, ou às suas famílias, o chamado "fracasso escolar", mas não a ela mesma.

É assim que o aprendizado deficiente, a falta dele, e o que é chamado de "indisciplina escolar", se transformam em "alunos problemáticos" ou "famílias ausentes".

Isso só pode resultar em conflito que, por sua vez, não é trabalhado pela instituição com a comunidade da qual participa.
Igualmente problemático é o fato de as famílias dos alunos que frequentam determinada escola ocuparem o lugar de consumidor ao se relacionarem com os problemas e/ou conflitos que surgem na trajetória escolar de seu filho.

Quando um consumidor adquire um bem, quer e exige que aquele bem seja exatamente como queria ou foi anunciado. Quando isso não ocorre, Procon na empresa!

Só que a educação não é um bem que pode ser comprado: é um direito, previsto pela Constituição —aí, sim, cabe a interferência do Judiciário para a garantia desse direito— que nem sempre está de acordo com os anseios e ideologias das famílias. Mesmo assim, o tratado de diálogo deve e precisa ser cumprido!
Para que esse relacionamento melhore e contribua para uma boa educação, é preciso que escola e comunidade se desarmem. Elas não devem estar uma contra a outra: devem ser aliadas, parceiras no sentido verdadeiro da palavra.

É preciso também que a escola renuncie ao lugar de soberana e que a comunidade abra mão do anseio de que seus descendentes aprendam apenas o que lhes parece conveniente.

É assim que um diálogo começa: com os envolvidos em um conflito se dispondo a ouvir, negociar, prestar contas e, principalmente, a assumir a responsabilidade que lhes cabe, conjuntamente.

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